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segunda-feira, julho 24, 2006

Falemos do estado do tempo

Iniciar uma conversa recorrendo a considerações sobre o estado do tempo é um hábito há longo adquirido. E apesar da crítica feroz provir de todas as frentes, este modo de desbloquear a conversa é ainda assim preferível a certas alternativas.

Há quem procure evitar a necessidade de recorrer à linguagem meteorológica, pelo que, ao apresentar amigos, familiares e conhecidos, acrescenta uma breve descrição sócio-profissional da pessoa. Argumentos a favor? Poupa-se no tempo e corta-se no embaraço de procurar um assunto inicial para estabelecer o diálogo.

Mas será assim tão descabido o desejo de se levar o tempo que for preciso – em especial quando a cadência de acontecimentos na linha temporal se encontra excessivamente acelerada – para descobrirmos por nós próprios o interlocutor, sem que uma terceira pessoa nos despeje à partida os preconceitos e julgamentos sobre o que considera ser interessante desbravar na conversa subsequente?

Uma silhueta torna-se cativante precisamente porque o que tem para revelar excede imensamente o que podemos perceber numa observação preliminar. E a forma como os contornos se vão preenchendo é tão essencial quanto a cor e o relevo em si mesmos. Em última instância, fale-se do tempo. Aí a pessoa é forçada a optar por uma descrição monótona ou por uma elaboração apaixonada; por uma visão pessimista ou pelo prenúncio de tempos melhores (literalmente). Um potencial recurso à imaginação pode até lançar pistas para sabores da chuva antes ignorados. Sabores… ou metáforas igualmente inusitadas, como os cães e gatos que chovem no provérbio inglês. E tal como os provérbios caracterizam uma forma de cultura popular, o modo como se aborda o mais banal dos assuntos revela o bastante sobre quem está a falar para prosseguir a conversa ou fugir declarando estar “mau tempo no canal”.

2 Comments:

  • inusitadas

    Bem... É verdade o que dizem, todos os dias aprendemos coisas novas.

    By Anonymous Anónimo, @ 12:06 da manhã  

  • Pode ser, mas há sempre quem procure passar por cima do que há a aprender para poder apenas confirmar aquilo que sabe. As crianças passam por uma fase semelhante - ou pelo menos de forma aparente, porque no seu íntimo continuam a absorver a novidade com avidez. Depois há os que se embebem do espírito socrático e se insurgem contra a postura dos sábios. E entre estes dois modos de estar - a afirmação de um estatuto que se quer auto-suficiente e o reconhecimento da própria insuficiência perante o que há a conhecer - as atitudes multiplicam-se.

    Bolas, quebrei a regra - deveria estar a falar do estado do tempo.

    By Blogger Cátia Monteiro, @ 1:00 da tarde  

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