Patch up your life
"Your concentration span's too long
It's longer than this song, that's not allowed
Dumb it down" (The Divine Comedy)
Os pensadores da contemporaneidade falam da velocidade crescente que pauta o ritmo da sociedade actual. A Internet baseia-se num jogo de links, fugas constantes do "local" onde estamos para o próximo (agora) mais interessante. É a "cultura do videoclip", classificam os analistas. You Tube, outras fontes de streaming na Net, iPod e congéneres vêm reunir-se ao gravador (VHS, DVD, HD) numa multiplicação, não dos pães, mas das possibilidades de registar, cortar, colar, e, sobretudo, de ver apenas enquanto apetece o que apetece, onde apetece. O que significa ultrapassar a condição do zapping na TV para um estádio mais avançado de patchwork multimédia.
Não me lembro da última noite em que passei cinco horas seguidas a absorver literatura; talvez por isso tenha cada vez mais a aprender. Os filmes, excepto no cinema, têm sido quase todos vistos "divididos em episódios" à medida da minha cinefilia limitada; hei-de começar a pedir um comando remoto, também à entrada das salas - imagine-se agora dezenas de pessoas a controlar o ritmo do filme do ecrã... as salas do Londres já não seriam as únicas a ter intervalo em Lisboa. Os álbuns são ouvidos por partes - singles pessoais. Sei que partilho este encurtamento do período de fruição criativa com muitos outros obcecados pelo switcher. Será que Il Gatopardo, de Visconti, não é, afinal, um filme desinteressante em 2007, mas apenas uma película sujeita a um consumo fragmentário que não se compadece dos seus (longuíssimos) 185 minutos (na versão original, já que há várias; e porque será?).
(divagação) As estrelas ainda granjeadas actualmente ao Gatopardo levam-me a imaginar os críticos de cinema vestidos de jaqueta, com a corrente do relógio a cair do bolso, cofiando languidamente o bigode e ameaçando com a bengala os transeuntes que se oferecem a barrar-lhes o caminho. Sim, porque os críticos que estrelam alegremente o Gatopardo não podem ser deste tempo. (fim de divagação)
E pronto, neste momento já perdi dois e meio dos meus três leitores (entre eles a minha mãe) por ter cometido o erro de escrever um texto mais longo do que qualquer pedaço de prosa que conseguiria ler de seguida. Hmmm, agora que me dedico ao pensamento, será talvez por isso que continuamos a ter obras longas demais: o ser humano é sempre capaz de se exceder na produção face ao que conseguiria assimilar no consumo. Então, como definir onde começa o consumo demasiado curto e termina a produção demasiado longa?
Foram o ovo e a galinha de hoje.
It's longer than this song, that's not allowed
Dumb it down" (The Divine Comedy)
Os pensadores da contemporaneidade falam da velocidade crescente que pauta o ritmo da sociedade actual. A Internet baseia-se num jogo de links, fugas constantes do "local" onde estamos para o próximo (agora) mais interessante. É a "cultura do videoclip", classificam os analistas. You Tube, outras fontes de streaming na Net, iPod e congéneres vêm reunir-se ao gravador (VHS, DVD, HD) numa multiplicação, não dos pães, mas das possibilidades de registar, cortar, colar, e, sobretudo, de ver apenas enquanto apetece o que apetece, onde apetece. O que significa ultrapassar a condição do zapping na TV para um estádio mais avançado de patchwork multimédia.
Não me lembro da última noite em que passei cinco horas seguidas a absorver literatura; talvez por isso tenha cada vez mais a aprender. Os filmes, excepto no cinema, têm sido quase todos vistos "divididos em episódios" à medida da minha cinefilia limitada; hei-de começar a pedir um comando remoto, também à entrada das salas - imagine-se agora dezenas de pessoas a controlar o ritmo do filme do ecrã... as salas do Londres já não seriam as únicas a ter intervalo em Lisboa. Os álbuns são ouvidos por partes - singles pessoais. Sei que partilho este encurtamento do período de fruição criativa com muitos outros obcecados pelo switcher. Será que Il Gatopardo, de Visconti, não é, afinal, um filme desinteressante em 2007, mas apenas uma película sujeita a um consumo fragmentário que não se compadece dos seus (longuíssimos) 185 minutos (na versão original, já que há várias; e porque será?).
(divagação) As estrelas ainda granjeadas actualmente ao Gatopardo levam-me a imaginar os críticos de cinema vestidos de jaqueta, com a corrente do relógio a cair do bolso, cofiando languidamente o bigode e ameaçando com a bengala os transeuntes que se oferecem a barrar-lhes o caminho. Sim, porque os críticos que estrelam alegremente o Gatopardo não podem ser deste tempo. (fim de divagação)
E pronto, neste momento já perdi dois e meio dos meus três leitores (entre eles a minha mãe) por ter cometido o erro de escrever um texto mais longo do que qualquer pedaço de prosa que conseguiria ler de seguida. Hmmm, agora que me dedico ao pensamento, será talvez por isso que continuamos a ter obras longas demais: o ser humano é sempre capaz de se exceder na produção face ao que conseguiria assimilar no consumo. Então, como definir onde começa o consumo demasiado curto e termina a produção demasiado longa?
Foram o ovo e a galinha de hoje.
3 Comments:
Um belo post como já não havia à muito tempo. (Na minha opinião de crítico de blogs, claro, que vale o que vale.)
Hoje em dia quando queremos determinada informação não estamos interessados nos fundamentos que a suportam. Não há tempo para nos preocuparmos.
Nunca reparaste nos documentários de 5 minutos que surgem como se de intervalos se tratassem no Discovery Channel? (Ou talvez seja o Odisseia, ou o História, ou ...)
Os pequenos grandes detalhes são deixados para os interessados (vulgo geeks) ou profissionais na matéria.
Em contraste a tudo isto, continuo a preferir as músicas que excedem os seis minutos de duração. Os meus amigos não me compreendem. =(
By Anónimo, @ 6:23 da tarde
Hmm, no seguimento do que dizes, começo a achar que a condição de geek tem vindo a ser alargada a todos nós. Porque se por um lado todos encurtamos os nossos inputs generalizados, pelo outro cada um tem a sua obsessão mais ou menos secreta.
Jogos de consola, álbuns dos anos 70, extensões de cabelo azul eléctrico frisado ou os túmulos de faraós do Egipto... entre muitas outras coisas que fomentam canais temáticos, revistas especializadas, comunidades web, etc., etc.
No fundo acho que consumimos aos bocadinhos, mas (muito) mais de uns bocadinhos do que de outros. O que acaba por dar origem a um padrão de conhecimento especializado - ainda que em "modo patchwork".
Quanto às músicas Long Play - há uma frase que sintetiza isso: "don't bore us, get to the chorus!" :p
Mas também gosto de algumas coisas mais longas, como Archive, !!! ... e, recentemente, algumas incursões a medo pela música clássica.
PS: os três pontos de exclamação são uma banda, as reticências nem por isso :p (para os mais imaginativos)
By Cátia Monteiro, @ 9:39 da manhã
Concordo.
De há 4 meses para cá que jogo com (ainda pouca) regularidade jogos de tabuleiro, "Settlers of Catan" e derivados (wikipedia-it para quem desconhece), e dum momento para o outro vejo-me membro de uma sub-cultura geek a que não escolhi pertencer.
Enfim, agora sou posto de lado nas saídas à noite. =(
Ao menos já começo a ganhar algumas partidas. =)
Em relação à música, é curioso verificar que uma das bandas que mais admiro só tem uma (ou duas) músicas com chorus. São os Pink Floyd. As minhas recentes incursões são pelo mundo progressivo dos King Crimson. A música clássica já a conheço desde criança. ;-)
By Anónimo, @ 11:14 da tarde
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